Depois de cerca de dois anos do lançamento do primeiro álbum Canção ao Lado em 2008, graças a um acaso de meu encontro com o Fado Português e o Cinema via reunião de Madredeus com Win Wenders em O céu de Lisboa, encontrei-me com essa deliciosa magia do uso da língua portuguesa que é DEOLINDA e seu mais recente álbum Dois selos e um carimbo.
DEOLINDA é alguém que "compõe as suas canções a olhar por entre as cortinas da janela, inspirada pelos discos de grafonola da avó e pela vida bizarra dos vizinhos". Como uma espécie de HOMERO dos tempos da compulsão pelo iphone e da herança do esquecimento do ouvido, DEOLINDA é-me uma experiência singular com o canto e a magia arrebatadora das palavras de uma língua mãe-de-criação, para não dizer materna.
Não sei falar de amor do primeiro álbum, por exemplo, diz o que apenas palavras soltas sem a carroagem ritmica da música jamais poderiam dizer: "E soubesse eu artifícios/de falar sem o dizer/não ia ser tão difícil/revelar-te o meu querer...". As cordas, no uso das duas guitarras clássicas e um contrabaixo, asseguram de modo doce e arrebatador a delicia mnemônica do retorno das palavras precisas que vão e vem em oscilações penetrantes e pungentes: como "um emaranhado de cordões que nos entrelaça o peito" tal como é o Fado, aparece-nos um tema universal sobre o paradoxo da vida humana e suas paixões!
Palavras assim ditas - nessa minha descrição, sem o acompanhamento preciso dos componentes fundamentais para a promoção do mesmo efeito pathológico daquele deleite cantado da voz de DEOLINDA, entediam-me a ponto de me fazer silenciar! Mas DESCREVER é preciso!
Pensando que a "perfeição quase não traz inspiração" e que, tomando as palavras de DEOLINDA, "estamos fartos do Belo", DEOLINDA a meu ver é um exemplo de como se alimentar da realidade e transfigurá-la em criação artística. Isso me faz pensar nas lavadeiras que encontram no canto a realização efetiva do que a humanidade sempre tentou designar como "felicidade". Penso ainda nos cantores yugoslavos injetando na memória viva das pessoas os engenhos e malogros de seus antepassados com palavras aladas e uma "rabequinha" desafinada; penso em Homero e nos cantores fictícios como DEOLINDA, que rondam o interior deste país que não possui um rio "Lilás como o Tejo", mas possui o componente fundamental que liga portugueses, brasileiros, eslavos, chineses, indianos, etc: o canto e a magia enigmática que o compõe o ato de cantar palavras aladas!
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